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2011-01-18

Filosofia, quem procura acha: Raimundos, Só no Forévis

Filosofia é uma coisa interessante. Se você procurar com cuidado, é capaz de achar densidade em qualquer lugar. Pra se ter uma ideia de como é possível vou mostrar a filosofia que pode ser atribuída a uma série de temas.

Inaugurando a coluna “Filosofia, quem procura, acha” vamos começar com o melhor disco dos Raimundos: Só no Forevis. Só em se tratar de uma homenagem ao humorista Antônio Carlos Bernardes Gomes, o Mussum, já é mais um argumento para o classificar como o melhor trabalho dos Raimundos.
Mas vamos ao disco em si, e mais do que isso as letras das músicas. Quem pensa que Raimundos é pornográfico, cheio de duplo sentido, raivoso, não está errado. Mas filosofia... Quem procura acha.

A música mais tocado do disco, talvez da história dos Raimundos por sua faceta Pop-Rock é “Mulher de Fases”. E do que trata a música?. Não tem muita profundidade, é apenas sobre a coisa mais complexa para o ser humano: relacionamento. Claro que num nível bem específico dos relacionamentos amorosos. Não é novidade a discussão sobre a dificuldade de se lidar com as idiossincrasias alheias no contexto dos relacionamentos. Talvez a novidade esteja em detectar isso numa música dos Raimundos, mas está claramente lá, as atitudes paradoxais com as quais o eu lírico tem de conviver. Já tinha imaginado? Discussão sobre idiossincrasias relacionais relativizadas por ciclos fisiológicos numa música dos Raimundos? Pois é... Mas quem procura acha.
A segunda faixa do disco é nada mais do que uma alfinetada contra a bundalização da mídia brasileira. Sério, “Mato Véio” é sobre isso. O critico é que isso era verdade em 1999 quando “Só no forevis” foi lançado e ainda hoje em dia. Talvez tenha mudado de Axé baiano para Funk Carioca, mas o quadro é bem parecido.
Que tal achar uma discussão sobre fanatismo e alienação numa música dos Raimundos? É disso que a faixa Alegria parece tratar. Começar com uma narração futebolística num país até idiotizado pela paixão ao futebol é o primeiro sinal. O clamor que Deus viesse vingar Jesus é a primeira agressão contra o fanatismo religioso. O comentário de que gente que se é cega em ilusão de luz é definitivamente uma alfinetada contra o fanatismo religioso. O grito de “Acorda!” é um outro alerta. Por muito menos que isso já encontram mensagens subliminares muito mais complexas em músicas tocadas ao contrário, então não se assuste se na próxima vez , ou talvez na primeira, que escutar “Alegria” dos Raimundos, veja toda a crítica ao fanatismo e alienação que a música contém.
Pode não ser dos mais politicamente corretos, mas os Raimundos falam de um tema polêmico, corrupção de menores, em “Me lambe”. A música começa alfinetando a culpa que a sociedade tem em deixar as crianças entrarem em contato com a sexualidade tão cedo. A letra é aberta ao explicitar que se trata da convenção social e da legislação, “Dá cadeia e é contra o costume”. Apesar da letra rodar de maneira boba em volta do relacionamento, quando o eu lírico é preso por estar com uma menor de dezessete anos mostra o argumento contra a tecnicalidade.
Uma ambiguidade interessante é a que ocorre quanto ao comentário do policial: “o homem de cassetete disse, quando me algemou. Que ela só tinha dezessete, que o pai dela era doutor. E que e se fosse eu ainda faria igual. Se fosse o ano que vem ia ser normal...”. Faria o que igual? Pegaria a guria? Ou o eu lírico está dizendo que o guarda explicou que se fosse o eu lírico, mesmo sendo homem, com apenas dezessete o policial teria feito o trabalho e algemado a moça? Ou uma terceira opção, se fosse o policial ou o eu lírico fosse o pai da moça também ia denunciar o “aproveitador”? Não vou fazer juízo de caso da narrativa contada, ou de valor da opinião dos compositores, mas é bom ficar claro que a letra trata da discussão sobre o tema de corrupção de menores na sociedade atual.
É difícil fazer rock no Brasil. Provavelmente sim, o que mais toca nas rádios é outra coisa, seja forró, axé, pagode, funk, etc.. Em “A mais pedida” os Raimundos viram as agulhas para o tema de censura e do que escolhem tocar nas rádios. Pro que não podia entrar menor no show dos Raimundos? Por que Raimundos não pode tocar na rádio? E a liberdade de expressão? Eles teriam de se render as imposições de censura e gravadora para tocar nas rádios? Mas a qualidade do que toca nas rádios? Se for levado em conta os padrões de hoje, o que separa o vocabulário dos Raimundos do vocabulário da Gaiola das Popozudas? Será que merece a discussão? Provavelmente não. Então resumo da ópera, ou pelo menos de “A mais pedida”: não se render a arbitrariedades de censura ou convenções modistas, fama não é tão importante, mesmo que pareça fundamental. Não é lá muito filosófico, mas encontrar a própria voz e identidade é uma das buscas internas mais fundamentais ao ser humano. E isso está na bobíssima, reprovável e de ironias chulas, “Me Lambe”.
Falando sério tem uma música que foge muito ao estilo escrachado e cômico dos Raimundos: Deixa eu falar. Se “A mais pedida” já tem menção a luta contra a censura “Deixa eu falar” é clara e aberta. Contém o já conhecido tom provocativo e agressivo dos Raimundos, com palavrões nos refrões, mas não deixa de ser mais um clamor ao direito fundamental de expressão, um alerta a todos que ouvem e uma provocação aos que censuram: “Deixa eu falar”.

Antes que alguém sequer sugira, é possível achar filosofia no funk carioca do MCs e mulheres fruta, ou no forró de aviões, garota safada ou calcinha preta, mas tem que ter quem procure... E eu não procuro. De todo modo, o que você acha que tem ou que não tem filosofia? Pensar a respeito já ajuda a procurar e quem procura acha, até mesmo filosofia.

6 comentários:

Anônimo disse...

Foda cara!



thiago.

Anônimo disse...

Mandou ver vei
Parabens

Anônimo disse...

não me leve a mal, não mas é meio obvio.

Anônimo disse...

meio obvio se tem yma coisa q raimundos nao e e obvio xD

Hiroshi disse...

Foda!

Anônimo disse...

Funk carioca e forro, kkkk nem eu procuro. Mas a letra da musica Alegria me chamou muito a atencao pelo fato de Rodolfo ter se tornado evangelico. E se a gente tivesse mais tempo pra prestar atencao com calma, perceberiamos muito mais coisas nos pequenos detalhes. Parabens, muito boa a análise.

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